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Aberdeen: o retrato de Macaé e Campos amanhã?


Daqui a 30 anos, Aberdeen será aqui. A pequena cidade escocesa, que tem o heliporto mais movimentado do mundo - alguma semelhança com Macaé? -, já viveu seu boom do petróleo, mas hoje enfrenta a curva descendente de um recurso natural não renovável. Rita Stephen, atual chefe de desenvolvimento econômico de Aberdeen, foi contratada justamente para ajudar a cidade a seguir em frente sem petróleo. Rita dá um conselho aos brasileiros: Macaé, Campos e companhia devem se preparar desde já para a hora em que o recurso acabar, e tiverem de viver sem essa receita.

O segredo, segundo Rita, é diversificar a atividade, usar o dinheiro obtido com petróleo para atrair outras indústrias. Aberdeen, por exemplo, tem muito vento e deve explorar, agora, o potencial de energia eólica. A cidade também quer ser um pólo de software para setores como o de defesa. Os avançados sistemas de terceira dimensão desenvolvidos para a indústria de petróleo poderão ser aplicados também na medicina. Para o norte fluminense, Rita cita o potencial turístico. O dinheiro dos royalties e dos impostos deve ser usado para criar infra-estrutura para receber os visitantes.

Rita aponta outro caminho. Quando a produção do Mar do Norte começou, em 1975, a região era a mais difícil de ser explorada no mundo, por adversidades como a logística e a baixíssima temperatura da água. Portanto, as empresas instaladas em Aberdeen tiveram de desenvolver tecnologias de ponta. Isso faz com que elas possam exportar tecnologia para o resto do mundo, minimizando o impacto do declínio na produção no Mar do Norte. O diretor-executivo da Organização Nacional da Indústria de Petróleo (Onip), Eloi Fernández y Fernández, diz que no Brasil os fornecedores já estão aptos a exportar tecnologia, por exemplo, para empreendimentos de Angola, Nigéria e Venezuela. Só não o fazem porque ainda há muita demanda no mercado interno.

Um dos exemplos de sucesso citados por Rita é o Wood Group, que começou como empresa pesqueira familiar - o pai e dois filhos - e hoje é uma das maiores fornecedoras britânicas de equipamentos para a área de petróleo, com vendas anuais de US$ 1,8 bilhão. O Wood Group faz parte intimamente da história de uma cidade que em 1911 empregava 6 mil pessoas na pesca, atividade econômica que hoje tem dois mil trabalhadores.

Um em cada cinco moradores de Aberdeen tem formação superior. O desemprego é de apenas 1,8%, contra a média de 4,5% na Escócia, mesmo com o declínio da produção e a grande crise enfrentada pela queda dos preços do petróleo entre 1997 e 1999. Em novembro de 1998, o preço do petróleo despencou para US$ 8, quando a meta divulgada pela Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep) era de US 21.

Aberdeen descobriu petróleo em 1969 e começou a produzi-lo seis anos depois. Há quatro anos, a porção britânica do Mar do Norte atingiu uma produção de 2,9 milhões de barris de petróleo por dia. Em 2002, a média caiu para 2,3 milhões. Aberdeen tinha, em 1960, 198 mil habitantes. Já chegou a ter 240 mil, mas hoje há 214 mil. No auge do setor, em 1997, a Grã-Bretanha empregava 360 mil pessoas no setor de petróleo, direta ou indiretamente. Um terço, ou 120 mil, estava na Escócia, e 60 mil especificamente na região de Aberdeen. O número caiu muito rapidamente. Atualmente, são 270 mil na Grã-Bretanha, 90 mil na Escócia e 25 mil na área de Aberdeen.

A pequena cidade escocesa não fez todo o dever de casa, e por isso agora Rita está lá. O editor do suplemento "Energy" do jornal "The Press and Journal", Jeremy Cresswell, que faz parte da comitiva britânica no Brasil, afirma que à Grã-Bretanha falta planejamento de longo prazo. Mas Aberdeen fez esforços para se desenvolver ao longo desse ciclo de quase 30 anos. Em 1975, criou o Offshore Supplies Office (SOS), para impulsionar a indústria fornecedora local. O objetivo era ter pelo menos 75% de conteúdo local nas encomendas da indústria de petróleo.

Segundo Rita, foram organizadas viagens para as empresas locais conhecerem o desenvolvimento de outras regiões produtoras de petróleo, como Houston, nos EUA. O governo britânico promoveu cursos de qualificação; intermediou contratos das empresas; arranjou moradias para as novas famílias que se instalavam; fundou escolas para filhos de franceses, holandeses e americanos; cedeu ou alugou a preços baratos terrenos para as companhias; e deu subvenções e infra-estrutura. Além disso, a cidade ganhou uma dúzia de hotéis e empresas como Shell e BP patrocinam eventos sociais e culturais.

O investimento do governo britânico no Mar do Norte foi de 200 bilhões de libras, e em troca o Tesouro recebeu 175 bilhões em impostos. Aberdeen paga 100 milhões por ano em impostos e recebe do governo 60 milhões. E aí há uma grande diferença em relação aos municípios brasileiros, que recebem royalties e participações espceciais diretamente das empresas produtoras. Na Grã-Bretanha, os royalties são pagos apenas no caso dos campos antigos. Atualmente, a legislação manda as empresas do setor de petróleo instaladas na Grã-Bretanha pagarem uma carga de impostos de 40%, o que já inclui uma taxa de cooperação. O resto da indústria paga 30%.

Segundo Cresswell, na média de todos esses anos a indústria de petróleo pagou ao Tesouro britânico impostos de 80%, na prática. Dinheiro que, segundo ele, a ex-primeira-ministra Margareth Thatcher usou para resolver questões do desemprego.