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Mudanças no pré-sal dependem também dos sindicalistas


De forma discreta, a presidente Dilma Rousseff distancia-se do modelo atual de exploração do petróleo na camada do pré-sal, uma de suas principais bandeiras políticas, abrindo caminho para aprovação do projeto do senador tucano José Serra que altera o marco regulatório do setor. Nos bastidores do governo, no entanto, ressalva-se que há o risco de mudança nessa estratégia, caso as lideranças dos petroleiros assumam uma postura agressiva pela manutenção das regras atuais. Nesse contexto, o Palácio do Planalto poderia dar prioridade à aliança com os sindicalistas, em nome da sustentação política do governo, e também posicionar-se contra o projeto.

A proposta apresentada por Serra retira da Petrobras a condição de operadora única dos campos de petróleo do pré-sal e ainda desobriga a estatal de participar com uma parcela de 30% dos consórcios de exploração e produção da área. Ao justificar sua iniciativa, o senador do PSDB de São Paulo considerou imprescindíveis as alterações para o “restabelecimento de um modelo que garanta a exploração ininterrupta e maiores possibilidades de ganho para o Tesouro Nacional”. Ele frisou que a exploração do petróleo no pré-sal não pode ficar condicionada “às fortuidades da capacidade de investimento da Petrobras”.

Os argumentos de Serra repercutem nas entidades empresariais, que têm se movimentado para tentar garantir apoio à aprovação do projeto. A Confederação Nacional da Indústria (CNI) é uma das entidades que apoiam formalmente a proposta em tramitação no Senado. As justificativas convergem para a necessidade de reativar o setor de petróleo e gás no Brasil. Mesmo levando-se em conta a conjuntura extremamente adversa no mercado internacional, com a queda acentuada das cotações do barril de petróleo, que despencaram da altura de mais de US$ 100 para um patamar inferior a US$ 30.

Os primeiros passos para flexibilizar as regras válidas para exploração de petróleo e gás no país foram dados em relação à exigência de conteúdo nacional. Um novo programa de estímulo à competitividade da cadeia produtiva do setor, batizado de Pedefor, foi criado pelo governo para aumentar a abrangência dos critérios utilizados na definição do conteúdo local nos projetos desse segmento. No caso do modelo de exploração do pré-sal, a legislação atualmente em vigor remonta ao final do mandato do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, como resultado de uma formulação que contou com a participação decisiva da então candidata presidencial Dilma Rousseff.

A expectativa de que o projeto do senador Serra seja colocado em votação, como prometeu o presidente do Senado, Renan Calheiros, poderá fechar um ciclo de transformações no marco regulatório do setor de petróleo e gás. A concretização das novas propostas significaria que o pragmatismo acabou por se impor numa área sensível ao embate político e ideológico. Com a virtual paralisia da cadeia de petróleo e gás no Brasil, na esteira das dificuldades financeiras e jurídicas enfrentadas pela Petrobras, as alterações na regulação sinalizariam também uma postura mais amistosa do governo quanto à atuação do capital privado no setor.

No momento em que se acentuam as incertezas na economia global, como mostram as oscilações nos mercados financeiros internacionais nos últimos dias, essa sinalização poderia adquirir uma importância que transcende as demandas de um segmento específico. Seria um movimento em direção a uma parceria mais intensa com o capital privado internacional. O desafio político dos defensores das mudanças no marco regulatório é convencer as lideranças sindicais dos trabalhadores, especialmente a Federação Única dos Petroleiros (FUP), a aceitar um modelo que retira boa parte do protagonismo conferido à Petrobras na era do pré-sal.

Sem a anuência dos sindicalistas ligados à Central Única dos Trabalhadores (CUT), ou pelo menos a garantia de um tom mais ameno em suas críticas, crescem de forma expressiva as chances de o governo vir a público para se opor ao projeto de Serra. A CUT mantém vínculos estreitos com o Partido dos Trabalhadores (PT) e dessa aliança depende uma face importante dos esforços do Planalto para afastar a ameaça de impedimento da presidente da República. Mas nada indica ainda que os petroleiros venham a se alinhar às expectativas de mudança no pré-sal. Até mesmo a venda de ativos da Petrobras para fazer frente à severa crise financeira da estatal tem esbarrado na oposição cerrada dos sindicalistas.

Fonte: G1 - Beth Cataldo