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A Trajetória dos Royalties e PE nos Municípios Produtores da Bacia de Campos: até que ponto justifica a antecipação de receitas?


As receitas de royalties e participações especiais consolidadas nos principais municípios produtores de petróleo da Bacia de Campos, no período entre 2007 a 2014, somaram a bagatela de R$20.225,8 milhões, cuja distribuição demonstramos no gráfico a seguir.

 

Gráfico 1: Receitas de royalties e PE consolidadas em 2007-2014

Fonte: Elaboração própria com base na ANP

 

Vejam que Campos dos Goytacazes contabilizou 44,8% das transferências, Macaé 18,5% e Rio das Ostras 12,0% do total, ficando o restante, equivalente a 24,7% para os municípios de Cabo Frio, São João da Barra, Quissamã e Casimiro de Abreu. A taxa de crescimento anual média das receitas, observada ao longo do período, coloca São João da Barra como o maior beneficiário com 40,05% de crescimento, seguido por Cabo Frio com 12,61% de crescimento, Casimiro de Abreu com 11,38% de crescimento, Campos dos Goytacazes com 10,11% de crescimento, Macaé com 8,96% de crescimento, Rio das ostras com 7,72% de crescimento e Quissamã com -1,47% de queda anual durante o período analisado.

 

Com exceção de Quissamã, todos os municípios registraram crescimento médio real, já que a inflação medida pelo IGP-M  bateu 5,93% no período analisado. Esse mesmo crescimento real das receitas de royalties e participações especiais deveria refletir positivamente na expansão do nível de investimento público, tendo em vista a sua natureza.

 

Neste caso, a taxa média de investimento por município até o ano de 2013, já que o fechamento da contabilidade de 2014 ainda não foi divulgado, é apresentada no gráfico 2 a seguir:

 

Gráfico 2: Taxa média de investimento no período 2007 a 2013

Fonte: Elaboração própria com base nos dados STN

 

Por esta análise, Rio das Ostras apresentou o melhor resultado com a aplicação de 38,37% das receitas de royalties e Participações especiais em investimento, seguido por Campos com 31,53%, São João da Barra com 26,78% e Macaé 26,35%. Cabo Frio investiu 23,79%, Casimiro de Abreu 17,85% e Quissamã 17,85% das rendas de royalties. Se considerarmos que o petróleo é finito e, portanto, as suas rendas responsáveis pela construção de projetos estruturantes nesses mesmos municípios, temos de reconhecer a baixa propensão a investir e, por outro lado, a grande facilidade dos mesmos em alocar recursos escassos em custeio e ampliação da máquina pública.

 

Como podemos observar, nesse período de abundância, preocupações como planejamento, implementação de projetos estruturantes, incentivo a criação de negócios sustentáveis, etc., parece não ter ocupado as prateleiras das prioridades nesses municípios. Com a desvalorização continuada do preço internacional do petróleo a partir de junho de 2014, caindo de US$ 108,37 neste mesmo mês para US$47,45 em janeiro de 2015, com lenta recuperação em US$61,3 em junho, as contas públicas se desorganizaram. Veja no gráfico a seguir a evolução dos preços de junho de 2014 a junho de 2015. 

 

Gráfico 3: Preço mensal por barril de petróleo

Fonte: Index mundi

 

Entretanto, uma análise mais detalhada permite afirmar que o problema da desorganização das contas públicas tem forte relação com a falta de visão dos gestores e, consequentemente, com a inexistência de planejamento. Os gestores só observaram o problema quando a sua contabilidade, pelo regime de caixa, viu minguar as suas receitas. Já era tarde demais!

 

A falta de visão sistêmica e o foco no populismo, cegaram os gestores públicos em relação à recessão mundial posterior a 2008, que levaria a retração da demanda de petróleo, assim como, o crescimento da oferta, fundamentalmente, pelo lado americano com a larga produção de gás de xisto, fatos que impactariam na presente desvalorização do preço do petróleo.

 

Por outro lado, o Brasil seria impactado negativamente, já que é exportador de commodities, dentre elas, o petróleo. Assim, só eles não sabiam que a conjuntura econômica do país se desestabilizaria, fraquejando o comércio exterior e as contas públicas. Como consequência, o emprego seria desacelerado e a inflação avançaria. Essa conjuntura afetaria as receitas orçamentárias dos municípios que deveriam ter se protegido com um melhor gerenciamento das despesas lá atrás.

 

Na ausência de fundamentos de qualidade na gestão pública dos municípios, sobrou a alternativa de recomposição das receitas presentes, através da antecipação dos royalties futuros. Diante desse quadro, um primeiro argumento contrário a essa engenharia financeira é a certeza da manutenção da prática gastadora sem as preocupações elencadas anteriormente. Um segundo argumento consiste nas bases da Lei de Responsabilidade Fiscal, que prega a necessidade de equilíbrio orçamentário em cada exercício fiscal. Um terceiro argumento se baseia, exatamente, na baixa propensão a investir dos municípios selecionados. Um quarto argumento se baseia nos pífios resultados históricos sociais (saúde, educação, segurança, e saneamento) e econômicos (baixo padrão de emprego e renda, fraca atividade industrial, setor de serviço de baixa qualificação e renda concentrada).

 

Finalmente, entendemos que esse é o momento ideal para uma grande reflexão sobre as práticas impostas à política e econômica no interior de todo o estado fluminense. Questões como a economia baseada em recursos naturais explorados por investimentos exógenos até a exaustão, o domínio exacerbado das forças políticas sobre a sociedade e a forte desigualdade social observada, precisam ser repensadas e transformadas em benefício da população.

Fonte: Alcimar das Chagas Ribeiro - Economista, D. Sc., pesquisador da UENF