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Setor naval tem forte dependência da Petrobras


Sem qualquer interferência pública, o atual ciclo de suspensão de investimentos e demissões nos estaleiros pode levar a indústria naval do Brasil aos níveis dos anos 90, quando o processo de abertura da economia expôs a indústria à concorrência externa e o setor quase deixou de existir.

Essa é a visão de Segen Estefen, professor titular de estruturas oceânicas da Coppe/UFRJ, que acompanha o setor desde 1976 e acredita que o governo terá de articular um "plano de socorro" para evitar que esse cenário se materialize. "A forma espontânea de resolução desses problemas é a destruição da indústria naval", avalia.

O setor naval é extremamente dependente das encomendas da Petrobras. Desde 2004, quando o Programa de Modernização e Expansão da Frota (Promef) da Transpetro alavancou a demanda por embarcações e plataformas, o emprego no segmento saltou de 12,6 mil para 82,5 mil no ano passado, de acordo com os números do Sindicato Nacional da Indústria da Construção Naval e Offshore (Sinaval).

"Por isso essa situação de bloqueio de investimento tem que ser equacionada", diz Estefen. O destravamento, para ele, passa por uma reavaliação das prioridades da estatal - dar preferência à fabricação de plataformas, usadas para a extração do óleo, e diminuir o ritmo de fabricação de sondas, usadas para explorar o pré-sal, por exemplo - e por uma reestruturação dos planos de negócio dos estaleiros, com possibilidade de repactuação das dívidas e ajuda do governo.

Apesar de boa parte deles já contar com acionistas do mercado externo - de Cingapura, do Japão -, dificilmente haverá grupos estrangeiros interessados em investir no setor até que o escândalo de corrupção na estatal seja julgado, afirma o professor.

Diversificar os mercados também é complicado, especialmente neste momento. "A queda no preço do barril de petróleo e das cotações das commodities diminuiu a demanda internacional", diz. Nesse sentido, o setor sofre com um problema anterior à operação da Polícia Federal - a falta de competitividade. "A entrega das encomendas vinha se dando em ritmo lento, mesmo antes da Lava-Jato", afirma.

Para Estefen, o setor precisaria contar com um centro de tecnologia, um espaço que ligasse "o conhecimento à indústria" e que elevasse a produtividade ao nível dos estaleiros coreanos ou chineses. "O custo disso estaria em torno de R$ 40 milhões, algo residual diante do preço de uma plataforma, por exemplo, que custa mais de R$ 1 bilhão."

Em paralelo, faria sentido enviar algumas encomendas estratégicas e pontuais para o exterior, para que a atual crise não afete o aumento recente de produção da estatal. "Esse é um setor que gera muitos empregos, tem uma cadeia grande de suprimentos", afirma Estefen.

As dúvidas sobre a elegibilidade para participar de licitações da estatal de petróleo brasileira é outra questão que preocupa o setor e divide opiniões entre especialistas e advogados. Não está claro se a empresa que tem entre os sócios uma das companhias que integram a lista dos atualmente impedidos de participar estaria também impedida.

As empresas evitam falar sobre o assunto. A Petrobras, por sua vez, ainda não esclareceu o alcance do chamado "bloqueio cautelar", anunciado no fim do ano passado, ou seu período de vigência.

Fonte: Valor Econômico