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Por que a produção de petróleo não cresceu, apesar do pré-sal


Entre 1997, ano da instituição do regime de concessão para exploração de petróleo e da quebra do monopólio da Petrobras, e 2010 a produção de petróleo no Brasil cresceu ao ritmo anual de 7%. Nesse período, o país atraiu volumosos investimentos e cerca de uma centena de empresas, entre operadoras, fornecedoras de equipamentos e prestadoras de serviços, passaram a operar no Brasil. Com a descoberta das vastas reservas da camada do pré-sal, em 2006, o cenário tornou-se ainda mais promissor.

Contudo, paradoxalmente, essa descoberta, fruto do regime de concessão, representou um ponto de inflexão negativo. Sob alegação de que o risco exploratório mais baixo e o elevado potencial do pré-sal justificavam maior participação do Estado na renda petrolífera, algo que poderia ser alcançado por decreto no regime de concessão, iniciou-se campanha pela alteração da legislação, que culminou, em 2010, com a instituição do regime de partilha e do virtual monopólio da Petrobras na exploração do pré-sal.

O ano de 2010 marca também o início da estagnação, que se mantém até hoje, da produção nacional de petróleo. Esse cenário é bem diferente do desenhado pela Petrobras em 2008, quando previa taxa de crescimento da sua produção de petróleo no Brasil, de 2009 a 2013, de quase 8% ao ano. A estagnação da produção e a combinação de forte crescimento do consumo de derivados de petróleo com atraso na instalação de refinarias levaram à rápida expansão do déficit na balança comercial de petróleo e derivados, que saltou de US$ 5,4 bilhões, em 2012, para US$ 20 bilhões em 2013.

Modelo bem sucedido de leilões anuais de áreas de exploração foi praticamente abandonado

Como é possível, dado o enorme potencial de produção da camada do pré-sal, que o volume de extração de petróleo no Brasil tenha estagnado e a balança comercial do setor tenha piorado tanto?

O patamar de produção de quase dois milhões de barris por dia e as características geológicas dos campos petrolíferos são parte da explicação. Com esse patamar de produção seria necessário extrair mais 140 mil barris de petróleo por dia para manter a taxa de crescimento de 7% ao ano, o que é um desafio considerável. Além disso, os campos petrolíferos, após atingirem o ápice, sofrem queda da produção de cerca de 10% ao ano. Mas a causa preponderante para o mau momento da indústria petrolífera brasileira foi a deterioração do ambiente de negócios.

Com a descoberta das reservas do pré-sal, o modelo bem sucedido de leilões anuais de áreas de exploração foi praticamente abandonado. As rodadas anuais de licitação para exploração de petróleo foram iniciadas em 1999. As licitações ocorreram normalmente até antes da 8ª rodada, em 2006, que foi suspensa por meio de liminares judiciais, em razão de cláusula editalícia que restringia as ofertas vencedoras por empresa operadora em cada área a ser licitada e tinha por objetivo evitar a concentração de áreas de exploração em mãos de uma única companhia petrolífera. Na 9ª rodada, em 2007, 41 blocos na área do pré-sal foram retirados do edital. A 10ª rodada, em 2008, ofertou apenas áreas em terra. De 2009 a 2013, devido às discussões sobre as mudanças na legislação do petróleo e de royalties, não foram realizadas novas rodadas.

Com o atraso dos leilões de exploração, foi postergada a entrada em operação de novos campos, o que resultou em perda de divisas para o país e de arrecadação pelo governo. Adicionalmente, bilhões de reais em investimentos deixaram de ser aplicados na exploração de petróleo e a expansão da cadeia de operadores, fornecedores de equipamentos e prestadores de serviço foi contida.

Concomitantemente, importantes campos de petróleo da Bacia de Campos, a principal região produtora do País, apresentaram acentuada queda de produção, provocada pelo esgotamento natural das reservas agravado pela falta de investimentos da Petrobras, que concentrou recursos na exploração dos campos no pré-sal. Mas mesmo nesses campos, os atrasos nas entregas de plataformas e outros equipamentos reduziram a produção em relação ao inicialmente previsto.

Atraso no cronograma e estouro do orçamento de projetos não são raros na indústria do petróleo, contudo no Brasil esses problemas são potencializados pela política de conteúdo local. Os fornecedores de máquinas e equipamentos nacionais praticam preços superiores aos dos principais fornecedores internacionais. Ademais, são comuns atrasos nas entregas dos equipamentos. Outro problema, este criado pelo regime de partilha, é a obrigatoriedade de que a Petrobras seja a única operadora e tenha participação de, no mínimo, 30% do consórcio vencedor do leilão. A execução pela Petrobras de todas as atividades de exploração, desenvolvimento e produção tende a desestimular a participação de outras empresas, diminuindo a concorrência dos leilões e, assim, a renda auferida pelo Estado. Além disso, a exploração do pré-sal fica limitada pela capacidade financeira e operacional da empresa.

Há também a contribuição negativa do controle do preço dos combustíveis, que prejudicou o faturamento da Petrobras, tornou-a a companhia petrolífera mais endividada do mundo e estimulou o consumo de combustíveis derivados do petróleo, o que aumentou o déficit da balança comercial do setor, além de praticamente inviabilizar economicamente o uso do etanol combustível no Brasil. Tudo isso após a realização de vultosos investimentos, estimulados pelo próprio governo para substituir a importação de derivados de petróleo, na ampliação da capacidade de produção do biocombustível.

Enfim, políticas erradas no setor de petróleo provocaram e continuarão provocando perdas bilionárias ao país, mas a produção de petróleo da Petrobras, apesar de tudo, deverá crescer nos próximos anos e isso será usado para mostrar o "acerto" das decisões tomadas. Sendo assim, comprova-se a atualidade da famosa frase cunhada por John D. Rockfeller: "O melhor negócio do mundo é uma companhia de petróleo bem administrada e o segundo melhor é uma companhia de petróleo mal administrada".

Fonte: Valor Econômico